Bom dia

Eu me lembro de acordar aos domingos antes de todos os meus irmãos. Era um dos poucos momentos em que eu ficava sozinho aos meus sete anos. Quando ficava deitado na cama de baixo da beliche, um sol pálido e preguiçoso acertando meus olhos de maneira pouco gentil.

Na meia luz do quarto, com a respiração de meus irmaos enchendo o ambiente, eu conseguia escutar minha mãe na cozinha pela porta aberta.

Era um som familiar de panelas no fogo, copos tilintando e uma melodia cantarolada baixinho. Eu podia ver os movimentos dela por debaixo dos meus olhos fechados e sabia que ela usava um avental amarelo, enquanto colocava canecas e pratos para nós três. Tinha pão quente, e eu me lembro da toalha de mesa florida que usávamos para brincar de cabaninha vezes sem conta.

Nessa hora eu costumava levantar sozinho da cama. Sem me espreguiçar, lavar o rosto, ou arrumar as cobertas. Eu só sentia o chão gelado contra o quente dos meus dedos, e caminhava até a cozinha desviando de carrinhos, bonecas e bichinhos de pelúcia. Sentava na cadeira fria de madeira e deitava a cabeça na mesa. Aproveitando a calmaria antes que eu e meus irmãos nos amontoássemos para comer.

Escutar minha mãe cozinhando me trazia paz.

O barulho do óleo na frigideira, a água fervendo e o murmurar da mesma canção. O cheiro de café recém passado, de leite quente, de pão fresco. Tudo isso me embalava e eu quase voltava a dormir ali mesmo na cozinha, o corpo tremendo pelo frio da manhã que entrava pela porta.

Mas ela sempre me notava sentado ali, antes de eu adormecer por completo. Uma risada gentil, um beijo na testa e um copo quente de leite com chocolate na mesa.

Claro que eu só notei todas essas coisas muito tempo depois, quando elas já tinham passado e eu não podia mais voltar atrás. E se eu soubesse hoje, acordando em um apartamento solitário com café amargo pra tomar, eu teria aproveitado mais o sorriso dela quando me via de manhã. Dividir a mesa com os meus irmãos e brigar por pão de queijo. Brigar por tudo e por nada ao mesmo tempo. Teria aproveitado mais todas essas manhãs.

Por Giulis.

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